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domingo, 28 de junho de 2009

O AMOR NATURAL EM SOBRE CORPOS E GANAS


Drummond já sabia o impacto que seu livro O Amor Natural poderia causar ao leitor mais desavisado e ao crítico literário mais conservador. O poeta até arriscou algumas publicações em revistas eróticas na década de setenta. Mas o todo foi obra póstuma.


O fato é que Drummond se permitiu desnudar a temática do amor. Mexeu no limiar entre o erotismo e a pornografia, ou seria no limiar do amor e do sexo? Fico com as duas possibilidades, uma não anula a outra, o poeta simplesmente fez poesia de modo direto com vocabulário sem rebuscamento, ou seja, poetizou o ato natural humano e todas as sensações que provoca. Leitor e poeta descobrem-se iguais ou parecidos.


Ocorreu-me então que em Porto Alegre tem um poeta que se arriscou nesta linha poética: dois Santos dos Santos. Em seu livro Sobre Corpos e Ganas, publicado em 1995, o sexo surge, em versos, como avalanche amorosa. O ato sexual, assim como a sensação que provoca, revela-se ao leitor como expressão lírica. Talvez falte, a algumas pessoas, a sensibilidade para ler seus versos, talvez ocorra uma interpretação equivocada de seus poemas e, por isso, às vezes, é comum encontrá-los em sites que os utilizam como mera ilustração verbal do sexo.


Essa falta de sensibilidade não ocorre apenas com alguns leitores, os próprios editores do livro foram infectados por uma espécie de puritanismo tardio. Em arrependimento editorial, retiraram Sobre Corpos e Ganas das prateleiras e quem saiu perdendo foi o leitor. Enfim, não há, ou pelo menos, não deveria haver hipocrisia entre quatro paredes, e por que haveria de existir na poesia?


Eis um poema do poeta Dois Santos!


Ela oferecia os seios

que ele sugava sem pressa

para sentir maior sabor

assim

como quem come moranguinhos

Com a mão espalmada

subia pelas coxas

em movimentos mais que suaves

deixando os pelinhos das pernas dela em pé

e a pele toda arrepiada

Invadindo o ventre

afagava ondas, dunas, colinas, sonhando

com regiões ainda inexploradas

Beijava logo a nuca frágil

de pássaro abatido

que dava (a ele)

essa absurda vontade de chorar

Entre sussurros mordiscava a orelha dela

E com um palavrãozinho

metia-lhe afinal a língua no ouvido

A mulher gemia a meia voz

arfava

e ele gemia junto

ao prolongar os seus ganidos

Mas isso eram só preliminares

que o mais era charco, pântano, areia

movediça

mistério a ser saboreado